O circo
As fotos retorcidas pareciam melhores, os sorrisos menos amarelos. A cara dele, desfigurada, um pouco menos cínica. As fotos aprisionam, pensou. Não queria estar para sempre ao lado de ninguém. O fogo reparava as situações que, àquela altura, preferia não ter criado para si mesma.
Voltou andando, estava tarde. Lamentou pelo vestido, era novo e já cheirava a fumaça. Apesar da hora, ainda cruzou com algumas pessoas na rua. A falta de esquinas em Brasília fazia com que todos parecessem andar sem propósito. Pisavam sem pretensão em linha reta, para irritar mesmo.
A vantagem de estar fora e não dormir é a manhã, pensou às 6h20, olhando para o céu laranja. Sorriu, enquanto pensava em como transcrever o que acabara de entender.
'Pai, mãe, vou partir, tem um circo em frente à casa. Pai, mãe, lá fora o sol é radiante e meu vestido esvoaçante tem um grande corte. Um grande beijo, um abraço forte.
Marcela.'
Ilustração: Estevão Mendes
Um comentário:
é, brasília causa essa sensação em todo mundo mesmo. mas até que é divertido caminhar sem propósito.
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