22 de out. de 2007

Instante - Idade Média: as luzes da Filosofia

Talvez, o erro mais comum em se estudar a Idade Média seja designá-la como um período de transição meramente entre a Idade Antiga e a Idade Moderna. Os holofotes sempre estão voltados aos Renascentistas – continuadores dos ideais científicos, artísticos e estéticos das civilizações clássicas – como que se houvesse um grande vazio intelectual no período medieval. Porém, se esquece que foi na Idade Média que surgiram as universidades e o florescimento e amadurecimento de vários saberes que influenciam até hoje o pensamento humano. Impossível pensar em Idade Média sem pensar em Filosofia, o verdadeiro motor no período medieval, e como ela teve um papel fundamental no desenvolvimento do pensamento intelectual da época.

Herdado o pensamento filosófico dos Antigos – uma busca pela essência e funcionamento do mundo – e levando-se em conta o rico material deixado por Aristóteles e pelos pensadores árabes, Averróis, por exemplo, a Filosofia estava em um caminho de lapidação. Porém, o curso foi diferente. Com a enorme influência da Igreja no mundo social e intelectual, muitas áreas, logicamente, ficaram manipuladas e amputadas. Os conceitos de família, vida e morte, por exemplo, foram quase que impostos. Tudo repousava sobre as vontades da Igreja e essa instituição detinha a maioria dos livros e escritos da época, angulando também o acesso à informação. Por esses fatos, no começo do período medieval, a Filosofia era inteiramente ligada à Teologia. E o estudo de qualquer uma dessas áreas era, além de manipulado, restrito a poucos lugares da Europa.

O estudo da Teologia baseava-se em dois livros fundamentais: a Bíblia e o Livro das Sentenças, esse último escrito por Pedro Lombardo. Tal estudo era muito mais teológico que filosófico. Entretanto, no século XIII, a obra de Aristóteles ficou cada vez mais conhecida, iluminada por comentadores árabes. Abria-se uma porta que oferecia uma outra visão de mundo coerente e modelo de saber. Tratava-se, portanto, saber se esse pensamento podia ser conciliado com os dogmas cristãos. Após inúmeras discussões, os teólogos optaram por predominar o ensino da Bíblia em vez dos conhecimentos aristotélicos. Houve, então, uma ruptura inicial entre Teologia – com um papel cada vez mais de ilustração da ortodoxia e censura de heresia – e a Filosofia – que trilhava por novos caminhos, tornando-se mais livre e flexível.

Após esse episódio, a Filosofia pôde se desenvolver, influenciando vários outros saberes. Primeiramente a própria Filosofia. Começou um desenvolvimento autônomo de uma Filosofia natural puramente racionalista, conciliando elementos de um sistema inteligível do mundo para iluminar com luzes próprias uma fé à procura não somente de salvação, mas de compreensão. Para o pensador medieval, todas as coisas contingentes espelham a perfeição divina, mas não necessariamente se identificam com ela. A Filosofia, a partir daí, dessacralizou, desmistificou e desdivinizou o mundo e seus elementos, com genuína mentalidade racionalista.

Essas mudanças tiveram uma inestimável influência no modo de pensar da humanidade, um modo mais organizado e racional. Nesse período de transição surgiram as universidades. As de Paris e Bolonha estão entre as mais antigas. Essas instituições sistematizaram os conhecimentos disponíveis naquele tempo, era um ponto de encontro da efervescência de pensamentos que no futuro vigorariam no Iluminismo e no Renascimento (o período das Luzes).
A universidade medieval não é um lugar onde simplesmente se reproduz o saber, é um lugar de produção do saber, de pesquisa e de contemplação. Não é um lugar enfeudado a um poder político ou religioso, é um lugar de poder diante de outros poderes. Essa nova instituição era um lar para aqueles que queriam olhar o mundo com os próprios olhos e se encontrar dentro dele.

Visto todo esse desenvolvimento, entre discussões e impasses, não podemos atribuir à Idade Média apenas um período de passagem entre Antiga e Moderna. “A quem insistir que esse período representa uma longa noite, deve responder-se que foi uma noite iluminada com muitas luzes e estrelas”, diz Reinhold Ullmann. E a universidade foi a luz maior, graças aos saberes que se desenvolveram com a Filosofia e que ela não deixa retroceder.
Alexandre Isomura

2 comentários:

Rejane Saraiva disse...

Filosofar é preciso. Entao lá vou eu:
Viva a filosofia do conhecer infinito. Líquida, nos preenche os espaços vazios. Sólida, nos impões barrreiras e aos poucos nos dá corda. Gasosa a respiramos sem saber.

Pona, meu amigo, espero por filosofias de bar!

Anônimo disse...

Por que nao:)